Como tudo na vida há ciclos que se fecham …
“DESGASTE FÍSICO E MENTAL E INDEFINIÇÃO SOBRE
O FUTURO DA EQUIPA CONTRIBUÍRAM PARA A DECISÃO”
Quando chegou, praticamente não havia jogadores.
Na segunda época ficou em 4.º lugar na 2.ª divisão distrital e depois colocou o clube na 1.ª divisão, onde
permanece.
Que Dinis Rosa fez um excelente trabalho no
Trafaria ninguém tem dúvidas. Por isso, foi com alguma surpresa que chegou a
informação de que não iria continuar no clube. Poder-se-ia pensar que teria
recebido uma proposta mais tentadora de outro emblema, mas na realidade não foi
isso que aconteceu.
Para esclarecer as razões que o levaram a
deixar o comando técnico do clube, ninguém melhor que o próprio.
Pelo que sabemos foi o Dinis Rosa que quis sair do Trafaria. Pode
saber-se porquê?
Sim, confirmo essa
informação. Foram quatro anos de muito sacrifício, emoção e amizade, mas a
verdade é que quatro anos não são quatro dias. Apesar de gostar do clube e de
todas as pessoas que nos acompanharam mais de perto, o desgaste físico e mental,
complementarmente com a indefinição do futuro da equipa sénior e de não
existirem perspetivas de desenvolvimento do nosso contexto de trabalho, foram
fatores decisivos e que concorreram para que tomasse esta decisão. Como em tudo
na vida, existem ciclos que naturalmente se fecham, sem que para isso tenha
necessariamente que haver mal-estar, insatisfação ou conflito entre as pessoas.
Foi o que sucedeu.
Qual o balanço que faz da sua passagem pelo clube?
Um balanço bastante
positivo. Subimos de divisão, mantivemos e sedimentámos desportivamente o clube
nas últimas duas épocas, na 1.ª divisão distrital, tudo isto em épocas em que
desceram de divisão 5 e 4 equipas, o que representa e espelha bem o trabalho de
todos, nestes quatro anos. Durante estes 4 anos, penso que todos conseguimos
escrever uma pequena, mas bonita página, na já vasta história do Trafaria. Quando
chegámos há quatro anos para orientar a equipa sénior, tivemos do ponto de
vista desportivo, que começar praticamente do zero e fazer captações um mês
antes da época iniciar, porque praticamente não existiam jogadores. Ainda
assim, fizemos uma boa primeira época, obtendo um quarto lugar, a 6 pontos da
zona de subida, quando abruptamente o campeonato foi interrompido devido ao
Covid. Foi um sinal para nós que estaríamos a desenvolver bem o nosso trabalho
e que uma possível subida de divisão, não seria impossível. Na segunda época,
num ano em que o Trafaria teve quase para não entrar em competição no escalão
de seniores, conseguimos com muita luta e sacrifício subir de divisão, e assim,
colocar muitas épocas depois, o Trafaria na 1.ª divisão distrital. Na nossa terceira
época, já na primeira distrital, e num conjunto de vinte equipas, conseguimos
obter um 13.º lugar e assim garantir a permanência. Nesta última temporada, num
conjunto de 18 equipas, conseguimos um meritório 11.º lugar no campeonato,
garantindo de novo o nosso objetivo. Além disso, chegámos aos ¼ de final da
taça, onde só viríamos a ser eliminados na casa do campeão da competição. Face
a isto, e tendo em conta as dificuldades estruturais, logísticas, entre outras,
e lutando na esmagadora maioria das vezes, contra outras equipas muito mais
apetrechadas nessas mesmas dimensões, penso que o balanço desportivo do que
conseguimos fazer em apenas 4 anos, é muito positivo. Foram no total 106 jogos
oficiais, com 42% de vitórias, 22% de empates e 36% de derrotas.
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O 11.º lugar obtido esta época está de acordo com o desempenho da
equipa ao logo do campeonato?
Julgo que sim. Apesar
disso, e porque acredito no treino e na sua relação com a prestação das equipas,
tenho a perfeita noção que se treinássemos normalmente, poderíamos ter tido um
desempenho superior. Já nem digo 5, 4 ou 3 vezes por semana, mas pelo menos 2
vezes por semana com o plantel todo ou quase todo e de forma consistente. Penso
que o desempenho e por consequência a classificação teria sido outra. A nossa
média de presença de atletas aos treinos, rondou os 7/8/9 atletas em muitos
casos de forma rotativa, tornando ainda mais complicada a nossa missão e
obrigando-nos a ter que repensar o treino, bem como a nossa abordagem tática e
estratégica aos jogos. Não existir uma equipa júnior de suporte, tornou ainda
mais complicado a nossa tarefa. De qualquer das formas, sabíamos que esta era a
nossa realidade, exigindo adaptação da parte de todos, fundamentalmente devido
a questões profissionais de muitos dos nossos jovens jogadores, que ao
contrário da nossa primeira época de Trafaria, viriam entretanto a iniciar as
suas atividades profissionais, muitas delas por turnos horários. Não foi fácil…
Como é que uma equipa que termina nessa posição consegue chegar ao fim
do campeonato com a quarta defesa menos batida, logo a seguir aos três
primeiros?
Por um conjunto de
razões. Logo à partida a qualidade e união dos nossos jogadores, que entenderam
que o processo defensivo não se esgota no guarda-redes nem na linha defensiva,
mas sim num compromisso e ideia coletiva. Depois, porque percebemos que do
ponto de vista tático e estratégico e devido às limitações de treino que
tínhamos, teríamos que ser em primeiro lugar, fortes, criativos e sólidos
defensivamente, para assim conseguirmos alcançar o nosso objetivo. Face a isso,
alterámos a nossa estrutura tática das épocas anteriores (4:4:2), para um
3:5:2, procurando com a especificidade da nossa forma de pressionar, sem
estacionar nenhum autocarro à frente da nossa baliza e defendendo o mais “alto”
possível, tentar surpreender e tornar desconfortável o jogo ofensivo do nosso
adversário. Por vezes conseguimos, noutras nem tanto, muito pela qualidade dos
nossos oponentes, desgaste físico e diminuição do foco e concentração
competitiva. Procurámos também, complementar esse trabalho com a visualização
de vídeos e com a sistematização de conceitos, tanto na teoria como na prática.
Como equipa técnica, face ao contexto, decidimos focalizar, sem descurar outras
fases, uma boa percentagem do nosso trabalho nos momentos defensivos,
fundamentalmente porque acreditamos que as diferentes fases defensivas do jogo,
apesar de tão valiosas como as ofensivas, são mais facilmente controladas quer
por nós quer pela equipa enquanto conjunto, visto serem procedimentos mais
fechados e menos abertos, indo também dessa forma, ao encontro das
características e pontos mais fortes que a nossa equipa teria. De qualquer das
formas, e apesar dos conceitos defensivos coletivos estarem muito bem
identificados por todos, a falta de sistematização na sua operacionalização
pratica, devido às nossas limitações ao nível do treino, levaram a que não
fossemos ainda mais eficientes nesse momento do jogo. Com mais treino, não
tenho quaisquer dúvidas que teríamos sido ainda mais eficazes nesse domínio do
jogo.
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Geralmente quando um treinador deixa um clube por iniciativa própria é
sinal de que já tem destino. É o que se passa consigo?
Neste caso não. Não sai
do Trafaria porque já teria outro clube. Saí principalmente pelo desgaste de 4
anos de muito trabalho e sacrifico e pela indefinição face ao que seria o
contexto em que iriamos trabalhar. Quando anunciei a minha saída do clube,
surgiram-me duas abordagens que agradeço e respeito bastante, mas que não iam
ao encontro das minhas motivações atuais. Nos diferentes clubes onde trabalhei,
Pinhalnovense, Fabril, Amora e Trafaria, excetuando o Fabril, onde apenas tive
4 jogos, saindo por opção pessoal, sempre desenvolvi ciclos duradouros, nunca
fui despedido e alcancei sempre objetivos desportivos, como 3 títulos de
campeão distrital, uma subida de divisão e várias manutenções, tanto em
campeonatos nacionais como distritais e em todos os escalões de futebol de 11.
Nesse sentido, só me resta aguardar que alguém tenha a mesma ideia e perspetiva
que os responsáveis desses mesmos clubes tiveram. Até agora, julgo que nenhum
se arrependeu!
Há algo mais que queira acrescentar?
Sim. Gostaria de
agradecer a todos os que me acompanharam nestes 4 anos. Ao presidente Wilson Lima
e vice-presidente Luís Barbosa, pela aposta nas nossas pessoas e por terem
também eles, dado tudo de si. À equipa técnica, que me acompanhou, (Desidério
Pascoal, Tiago Lima e Carlos Faria/Calita) enormes pessoas e grandes
profissionais. Sem eles teria sido impossível. Aos jogadores que nunca me
abandonaram e que constituíram uma verdadeira família…jovens com muita
capacidade e com um património moral difícil de encontrar na sociedade atual. Ao
nosso fisioterapeuta e grande profissional, José Almeida. À dona Lúcia, técnica
de equipamentos, pela forma como nos acolheu deste o primeiro dia. Ao Fernando,
nosso antigo fisioterapeuta, que se foi tornando entre outras coisas, também,
meu conselheiro. A todos os que, embora de forma descontínua, também nos
ajudaram e foram importantes. Aos adeptos/familiares que nos apoiaram. E à
minha família e namorada pelo apoio dado ao longo destes anos.