A experiência vivida na China
e Noruega…
“O PROJECTO EM QUE ESTOU
ENVOLVIDO TEM UM POTENCIAL ENORME PARA CRESCER”
Na China quando se deslocavam a campos ou escolas eram abordados por pessoas que pediam autógrafos, fotografias, tocavam na cara e na barba. Parecia algo que nunca tinham visto na vida.
Rodrigo Silva, também
conhecido por Rodri, que fez o seu percurso de jogador na AD Quinta do Conde e há
duas épocas atrás se transferiu para o Zambujalense, onde iniciou a sua carreira
de treinador, foi no final de 2019 para a China para trabalhar numa academia
que tinha uma parceria com o Benfica.
A pandemia de Covid-19 fê-lo
regressar a Portugal, onde ficou a trabalhar à distância, mas já não deu para
voltar. Entretanto, surgiu um novo convite e em Setembro rumou para a Noruega.
No contacto que
estabelecemos convidámos Rodrigo Silva a falar da aventura.
No
final de 2019 foi treinar para a China. Quer falar um pouco dessa experiência?
Fui para a China em Novembro
de 2019, para uma pequena vila chamada Rudong, na província de Jiangsu, perto
de Shanghai. Estava a trabalhar numa Academia de Futebol, em parceria com o SL
Benfica e estava responsável pela equipa de Sub17. Estava a ser uma experiência
muito boa e extremamente desafiante. A barreira linguística estava a ser um
desafio brutal - trabalhávamos com tradutores -, mas que serviu para perceber
que a linguagem futebolística é efectivamente universal. A partir do momento em
que comecei a saber algumas palavras em chinês as coisas começaram a ser um
pouco mais fáceis. Tive também a oportunidade de perceber que existe qualidade
em solo chinês (atletas com potencial evolutivo), mas fico com a sensação que
devido à cultura por vezes ficam um pouco estagnados. O povo chinês dá muito
ênfase ao resultado imediato e deixam um pouco de lado o processo evolutivo dos
jogadores. Existem grandes condições de trabalho, onde ao contrário de
Portugal, não existe défice de material para podermos fazer os nossos treinos.
No entanto, acabou apenas por ser uma experiência de 2 meses, visto que
regressei a Portugal para a Quadra Natalícia e em virtude da Pandemia, já não
tive autorização para regressar. Acabei por ficar em Portugal a trabalhar à
distância (concedi uma entrevista ao Canal 11 a falar dessa mesma experiência).
Considera
positiva essa experiência?
Apesar de curta, foi uma
experiência extremamente positiva. Permitiu-me conhecer outras realidades,
outra cultura, abrir os meus horizontes futebolísticos e perceber que existe
algo mais fora de Portugal. O facto de estar a trabalhar como profissional de futebol
é algo que também destaco como um ponto extremamente positivo para mim.
Infelizmente, e como já referi apenas peca por escassa. O facto de ter estado
apenas 2 meses (quando deveria ter sido no mínimo 12 meses) deixa um sabor
amargo e a sensação de dever por cumprir.
Encontro-me a trabalhar na
Noruega desde o início do mês de Setembro. Estou neste momento a viver em Oslo
e ligado contratualmente a uma Academia de Futebol. O projecto desta Academia
(que não tem um espaço físico associado) tem como base proporcionar treinos
ministrados por treinadores portugueses ao longo dos países da Escandinávia. Em
suma, em datas seleccionadas deslocamo-nos a determinados campos e ministramos
sessões de treinos aos atletas que se inscrevem para essas datas. Estas sessões
de treino podem ser de 1 dia, 2 dias, 3 dias ou 5 dias. Portanto, não possuímos
uma equipa fixa e jogos regulares, no entanto, sempre que existir torneios que
possamos participar fazemos uma selecção dos atletas que já leccionamos e
criamos uma equipa competitiva. Aos atletas que os treinadores considerem que
tenham condições para algo mais, podemos recomendar a fazer uma semana de
experiência em Portugal. Trabalhamos com atletas nascidos entre 2012 e 2004.
Está
a correr bem?
Até ao momento está a ser
uma experiência extremamente positiva. Noruega é um País com uma excelente
qualidade de vida e com um potencial muito grande em termos futebolísticos. Estou
bastante impressionado com a qualidade individual que estes atletas têm
mostrado, no entanto, com algumas dificuldades ao nível do entendimento do
jogo. As condições materiais e físicas são espectaculares - não me lembro de me
ter deslocado a um campo ou ter realizado um treino onde tivesse falta de
material - e dentro em breve iremos começar a ter treinos indoor em virtude do
frio que se vai fazer sentir. Acredito que o projecto em que estou envolvido
tem um potencial enorme para crescer e contribuir para a evolução e crescimento
dos atletas noruegueses.
China
e Noruega são dois países completamente diferentes, não sentiu dificuldades de
adaptação em nenhum deles?
Felizmente posso gabar-me de
num momento tão difícil que todos atravessamos estar a trabalhar na área em que
sempre quis trabalhar e estar a desenvolver a minha actividade profissional sem
muitas restrições. A minha adaptação à Noruega foi bastante tranquila e fácil,
estar num país europeu com um fuso horário semelhante ao português facilita muito
a adaptação. Até ao momento ainda não tive problemas com o clima, mas acredito
que dentro em breve poderá começar a custar um pouco mais. O facto de 90% da
população falar inglês (inclusive os atletas) facilita muito a realização das
sessões de treino! Relativamente à adaptação à China, essa foi um pouco mais
complicada. Para começar recordo-me de na primeira semana ter bastantes
dificuldades em adaptar-me a um novo fuso horário (+ 8 horas que em Portugal) -
dificuldades de descanso e adaptação às horas de sono -, grandes dificuldades
para manter a comunicação com familiares e amigos e alguns hábitos culturais
(Ex. horário de almoço ser às 11h). A barreira linguística é efectivamente um
grande problema. Em relação à alimentação, felizmente não tive nenhuma
dificuldade em adaptar-me, visto que sou um apreciador de comida asiática,
acabou por ser algo muito positivo. No aspecto futebolístico, felizmente não
houve dificuldades de adaptação e os atletas acabaram por se conseguir adaptar
bastante bem à nossa metodologia de treino.
Existe alguns episódios
curiosos que posso partilhar que aconteceram na China. O facto de ter estado
numa vila onde praticamente não existam ocidentais (arrisco-me a dizer que os
únicos éramos nós - 6 portugueses), sempre que andávamos nas ruas ou nos
deslocávamos a campos/escolas as pessoas abordavam-nos, pediam-nos autógrafos e
fotografias, tocavam-nos na cara, nomeadamente na barba e para eles parecia
algo que nunca tinham visto na sua vida. Fui também alvo de uma partida
engraçada por dois colegas meus que já se encontravam na China desde o ano
transacto e já dominavam um pouco o chinês. Certo dia, num restaurante eu
necessitava de ir a uma casa de banho e peço-lhes para eles me dizerem como eu
o poderia dizer em chinês, logicamente que as palavras que foram ditas nada
tinham a ver com isso e acabei por fazer/dizer um convite indecente à
responsável do restaurante, que ficou estupefacta a olhar para mim - mas acabou
por perceber que era uma brincadeira. Outra história que me recordo, aconteceu
a um colega meu, que durante algumas semanas e sempre cumprimentava os seus
atletas estava na verdade a dizer uma asneira ofensiva (significado similar ao f*ck
em inglês). Ele ouvia sempre os seus atletas a dizer essa palavra, que
sonoramente se assemelha a “What’s up?” em inglês. E na sua inocência julgava
que não tinha qualquer significado associado e que seria apenas uma expressão
verbal. Em suma, sempre que cumprimentava os seus atletas estava na verdade a
dizer algo completamente diferente. Por fim, a maioria dos campos de futebol na
China (em que estive envolvido) não têm balneários, ou seja os atletas vão
equipados no autocarro para o jogo e voltam equipados após o jogo. 25 atletas
num autocarro após o jogo com o mesmo equipamento não é de todo agradável.
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